Olhe, meu amigo, os homens percorreram todos os mares sem o vapor e trilharam toda a superfície da terra sem as locomotivas. Para leval-os pela aguas os navios eram como grandes aves viageiras - á hora da partida abriam as azas largas e lá iam sem risco de explosões e, em terra, eram os carros de bois que rodavam, eram os cavalleiros que passavam a galope, eram os elephantes carregando ás costas familias inteiras, e camellos que trotavam pelos areaes abrasados. A viagem era vagarosa, mas a gente tinha a certeza de chegar ao seu destino. Para civilisar o mundo o homem não precisou d'essas complicadas "mechanicas", agora que está tudo prompto é que os taes progressistas se lembram de estender trilhos e de aquecer caldeiras, para que? Olhe, meu amigo, depois de jantar o meu feijão pódem vir os melhores manjares d'este mundo porque eu nem os provo - estou farto. É assim tambem com as taes "mechanicas". Agora que o mundo está conhecido de polo a polo é que vêm vapores, estradas de ferro, o diabo... Porque não inventaram essas coisas antes? Com que companhia de vapores se estendeu Moysés para transportar os israelitas atravéz do Mar Vermelho? Em que comboio fugiu Nossa Senhora para o Egypto? Os primeiros effectuaram a travessia a pé e a Virgem fez a viagem montada num jumento... Histórias! E veja meu amigo: Quem viaja a cavallo ou em carro de bois sente um alegrão doido quando vê na estrada, ao longe, outro cavalleiro ou quando ouve o rincho de outro carro de bois; e no trem? Se a gente vê vir, na mesma linha, outro comboio em sentido contrário, só tem uma coisa a fazer: é encommendar a alma ao Creador, porque está frito. Não, meu amigo - Deus não quer pressas, devagar se vai ao longe. O dia continua a ter as mesmas 24 horas, nem mais, nem menos; os infantes nascem com o mesmo tempo e, se se precipitam, não resistem. Não contrariemos as leis divinas. (NETTO, Coelho. A bico de penna: fantasias, contos e perfis. 2ª ed. Porto: Chardon, 1919, pp. 60-62)
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